12 de fev. de 2014

A importância dos cinco vayus no processo evolutivo do yogui



Os bandhas podem trazer diversos benefícios do ponto de vista físico, como o fortalecimento de músculos mais profundos, o massageamento dos órgãos internos, além de oferecer maior suporte e estabilidade ao corpo, impedindo lesões durante a execução das posturas.

Há, entretanto, aspectos mais sutis da prática de yoga que justificam sua utilização. Esse artigo do prof. Osnir Cugenotta  explica os aspectos energéticos envolvidos com as práticas dos bandhas, além de esclarecer o por quê de recomendações como a de não beber água durante a prática de yoga  e de se fazer um resguardo de pelo menos meia-hora antes e depois da prática para comer ou beber.


A importância dos cinco vayus no processo evolutivo do yogui
Por Osnir Cugenotta

Descrita primeiramente nos textos tântricos, a exposição dos pancavayus – ou cinco vayus é nitidamente o fruto da experiência interna dos yoguis tântricos. Por essa razão, ao abrirmos um bom livro de Hatha Yoga, comumente nos deparamos com algumas orientações, como não realizar asanas de estômago cheio, evitar o banho logo após a prática, etc. Os motivos mais profundos destes conselhos dificilmente são explicados e, por não serem totalmente compreendidos, são frequentemente negligenciados ou raramente seguidos.

A verdadeira razão para tais orientações está diretamente relacionada aos cinco vayus – ou energias internas existentes em todo ser humano-, os quais possuem tanto aspectos de controle das funções orgânicas do corpo quanto aspectos energéticos mais profundos, como por exemplo, o despertar da kundalini. Além dos cinco prana vayus principais, existem outros cinco vayus secundários denominados upapranas. Esses dez pranas têm como tarefa principal controlar todas as funções do corpo humano.

Os cinco pranas principais são:
1-    Prana  vayu, que se move da garganta ao diafragma e controla respiração, os batimentos cardíacos, a circulação e a fala;
2-    Apana vayu, que se move na região abaixo do umbigo e controla a exalação, todos os movimentos de eliminação, menstruação, nascimento, ejaculação, as secreções intestinais e urinárias;
3-    Samana vayu, que se move entre o coração e o umbigo e controla o sistema digestivo, todo tipo de assimilação, atua na harmonia entre prana e apana, e também auxilia o coração e o sistema circulatório;
4-    Udana vayu, que se move entre a garganta e o topo da cabeça, controlando os órgãos localizados nesta região como olhos, nariz, ouvidos e cérebro. Todos os receptores sensoriais são ativados por este vayu, que rege o ato de tossir, engasgar, soluçar e engolir;
5-    Vyana vayu, que se move por todo o corpo levando prana para todas as células do corpo. Atua sobre a circulação, pensamentos, músculos e juntas. Este vayu é responsável pelos movimentos, coordenação e a habilidade de manter a postura ereta – fundamental à meditação.

Os upapranas são:
1-    Naga, que controla o ato de vomitar;
2-    Kurma, que controla o abrir dos olhos;
3-    Krkara, que desperta a fome;
4-    Devadatta, que controla o ato de engolir; e
5-    Dhananjaya, que causa a distensão abdominal e o inchaço, principalmente aquele que ocorre após a morte.

A Yoga -Chudamani-Upanisad declara: “Aquele que possui o conhecimento sobre os vayus é um yogui  no sentido verdadeiro”. Está escrito no Hatha-Yoga-Pradipika 2:2: “Enquanto o prana se move, citta (a força mental) se move Quando o  prana se aquieta, a mente se aquieta”. Por essa ração num dos vyas-kutas (pontos-chave) do Bhagavad-Gita, Arjuna diz (6:34): “Pois a mente ó Krsna é inquieta, turbulenta, obstinada e muito forte e subjugá-la é, assim me parece, mais difícil que controlar o vento (vayu).

A maioria das pessoas, quando lê essa passagem, via de regra a interpreta erroneamente, acreditando que Arjuna está dizendo ser tão impossível controlar a mente como controlar o vento. Na verdade, ele está nos indicando o quanto é fundamental o conhecimento, controle e maestria sobre os vayus, o que torna possível o domínio e o controle da mente, das emoções e dos sentidos.

É importante lembrar aqui a observação de Swami Niranjanananda Saraswati da Escola Bihar de Yoga, em seu livro Yoga Darshan- Vision of the Yoga Upanisads, de que, quando nos referimos aos pranayamas, estamos falando do completo controle das funções dos pranas, e não daqueles exercícios respiratórios praticados pelos yoguis e yoguinis iniciantes. Somente quando o prana passa a ser experimentado dentro do contexto sutil dos chakras, é que o verdadeiro pranayama realmente tem início.

Os textos tântricos descrevem uma técnica denominada prana nigraha. A palavra nigraha significa controle e, neste caso, prana está associado aos prana vayus – mais especificamente aos três vayus: prana, apana e samana. Swami Niranjanananda Saraswati em seu livro Prana Pranayama Prana Vidya explica este conhecimento da seguinte forma:

Dos cinco pranas, os dois mais importantes são prana e apana. Prana é uma força que se direciona ao interior, de ação ascendente, que se move do umbigo à garganta. Apana é uma força que se direciona ao exterior, de ação descendente, movendo-se do umbigo ao ânus. Tanto prana como apana se movem espontaneamente pelo corpo, mas podem ser controladas através de práticas tântricas e do yoga.

As Upanisads dizem que estas práticas tendem a ser utilizadas para reverter as forças de prana e apana que movem em sentidos opostos, objetivando sua união ao samana no manipura chakra. O Yogiraj Shri Shyama Charan Lahiri Mahasaya, o Maha Guru do Kriya Yoga, ensinava a técnica do Nabi kriya com este propósito, pois tal kriya tem como função primária equilibrar as energias sutis de prana e apana, direcionando-as e unindo-as ao samana vayu no Nabi (manipura chakra), resultando essa união no despertar da kundalini. Swami Niranjanananda Saraswati relaciona o controle sobre essas três forças ao comentário feito por Patanjali em seu Yoga Sutras dizendo: “Nos Yoga Sutras, o sábio Patanjali fala dos três tipos de pranayama, mas sua descrição é muito simples e breve. Ele diz que inspiração, retenção e expiração são os três tipos de pranayama. Quando as pessoas leem isso, elas acham que o processo físico de inspiração, retenção e expiração representam os três tipos de pranayama mencionados, mas não é bem assim. Estes três estágios representam na verdade o despertar dos três pranas. A inspiração corresponde ao controle de prana, a retenção corresponde ao controle de samana e a expiração corresponde ao controle de apana. Portanto, de acordo com este sutra, o controle dos três pranas é o verdadeiro pranayama, que é chamado de prana nigraha”. Adicionalmente, a indologista Tara Michael em seu livro Le Yoga, no capítulo sobre Hatha Yoga, refere-se a prática do maha bandha (ou seja o uso concomitante de mula bandha, uddiyana bandha e jalandhara bandha), como uma das técnicas recomendadas para proporcionar a mesma inversão dos vayus e sua união no manipura chakra.

Durante a prática dos asanas e dos pranayamas, nós mudamos a direção do movimento normal dos vayus. Ativamos a força de apana vayu, que normalmente flui para baixo direcionando-a para cima, de modo a utilizar esta fonte de energia para obter a iluminação.

A inalação consciente dirige o prana para baixo, o que abre a boca do susumna Nadi, canal central localizado no interior da coluna, por onde deve fluir a energia primordial. A contração consciente do assoalho pélvico (mula bandha) conduz apana vayu para cima através da boca do susumna aberto. Quando o diafragma é elevado durante a expiração e o abdômen é sugado para dentro e para cima na prática do uddiyana bandha, prana, apana e samana vayus unem-se no susumna nadi. Logo, se comemos ou bebemos algo logo após a prática dos asanas ou pranayamas, samana vayu, que é responsável pelas assimilações, voltará à sua função fisiológica, deixando de auxiliar prana e apana vayu,  e não poderá atuar em prol da auto-realização. De igual maneira, se devido ao consumo prévio de fluidos, houver necessidade de esvaziar a bexiga durante ou logo após a prática, apana novamente voltará a fluir para baixo neutralizando assim os aspectos mais importantes e profundos dos asanas.

Portanto, na próxima vez que você se deparar com estes conselhos, não os ignore e conscientize-se da sua importância, penetrando um pouco mais no mais profundo dos aspectos do Yoga: o despertar da kundalini ou a iluminação da consciência.